CNT006_P01. Visita pouco oportuna


COM o abrir imprevisto da porta da velha barraca, My Meckness levantou o rosto sulcado por rugas e cicatrizes e não pôde dissimular o forte estremecimento que o fez erguer de um salto.
No limiar, entre os umbrais denegridos e carunchosos, surgira a figura atarracada e suja de Vil Thompson. Empunhava um reluzente «colt» na mão esquerda e dava voltas a uma moeda de cobre entre os dedos da direita.
— Eh, amigo! — exclamou com um sorriso que mais parecia uma careta.
— Grande surpresa hem?! Não… não sou um fantasma. Aqui me tens de carne e osso... Pensavas tu e esse imbecil do Sprightly que neste momento eu repousava pelos múltiplos papos dos abutres! Enganaram-se, meu velho... Vil Thompson não se deixa vencer tão facilmente!
O outro fitava-o assombrado como se duvidasse do que via. E aquelas palavras secas, marteladas com firmeza, tiravam--lhe o calor do corpo.
— Antes de te suprimir — continuou o recém-chegado — permito-te uma satisfação: porque te procurei primeiro a ti do que a Sprightly. — Fez uma pausa e prosseguiu: — Quero agradecer-te pelo facto de esqueceres junto de mim, no dia da vossa traição, esta arma! — e na sua mão o «colt» volteou pelo dedo e estacou na posição primitiva. — Esta arma que conserva no tambor duas balas... as duas balas que farão cumprir a minha vingança. Uma para ti, outra para Sprightly!
Calou-se por instantes, como se saboreasse a: palavras proferidas. Eram frases de há muito concebidas para resultar aquele efeito. E continuou:
— Agora vais dizer onde esconderam o ouro. Sei que não o venderam... Por isso, nada de subterfúgios, senão... far-te-ei passar um mau bocado. Vamos, fala! Fala que eu oiço e o gatilho espera...
My Meckness tentou dizer algo para ganhar tempo, mas a voz amarrara-se-lhe na garganta e nem o mais leve som lhe saía pelos lábios. A surpresa prostrara-o. E a convicção de que o fim estava próximo, desorientava--lhe o espírito, obcecando-lhe o raciocínio. Gostaria, talvez, de aceitar os acontecimentos naquela semi-inconsciência para que as sensações fossem nulas e o fim resultasse impreciso. Mas Vil Thompson estava ali! Ali, com um «colt» e uma determinante: vingar-se! E pretendia dois resultados com esta vingança: a morte dos dois homens para aplacar o ódio que lhe fervia no sangue, e conseguir uma riqueza fácil, para re-6 construir a vida longe daqueles sítios.
Estes objetivos faziam-no ter lâminas na voz quando exclamou:
— Então?! Porque esperas, idiota! Fala claro e depressa. Ou preferes «dançar» antes de fechares os olhos?
Porém, naquele momento, algo se passava pelas suas costas. Uma figura alongada, silenciosa e traiçoeira, deslisava pela porta e vinha colocar-se bem por detrás de Thompson. O brilho frio de uma arma reluzia-lhe na mão. Um sorriso cruel desenhara-se nos lábios — lábios que se não chegaram a mover quando uma voz irónica os trespassou:
-- Aconselho-te a que não faças um único movimento, fantasma. Folgo em ver-te… embora a tua visita não seja oportuna.
Vil Thompson não demonstrou o mais insignificante sinal de surpresa. No entanto, o seu olhar endureceu e os músculos ficaram tensos. Largou o «colt», enquanto respondia:
— Sê benvindo, Sprightly!

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PAS743. A história do homem que matou o melhor amigo

HBD013. Aventuras de Kit Carson publicadas em Portugal