PAS488. Um tiro na noite escura

— Não sejas criança — sorriu-se Farley. — Eu próprio me sentirei mais tranquilo sabendo-te em lugar seguro.
— É verdade tudo isso que me dizes? — perguntou ela levantando para ele o rosto.
— Nunca falei tanto a sério. Creio que seria muito penoso para mim separar-me de ti — murmurou. — Temos passado momentos difíceis e jamais poderei abandonar-te.
Margarida permaneceu uns instantes silenciosa.
— Importas-te se te perguntar uma coisa? — inquiriu em tom travesso.
— Nunca poderás incomodar-me.
— Neste caso... Existe alguma mulher na tua vida?
— Nenhuma — respondeu Farley, sem titubear.
Então, num repentino impulso, Margarida deitou-lhe os braços ao pescoço.
— Oh! Donald! =exclamou. — Que feliz me torna saber que posso ser a primeira!
Farley ficou imóvel, surpreendido com a repentina reação da rapariga. Mas esta aproximava já o seu rosto e oferecia-lhe os lábios com tão cândida sugestão, que Farley não foi capaz de resistir a provar a doçura do beijo, que estremecia como a gota de orvalho no cálice de uma rosa de fogo.
Durante uns instantes permaneceram estreitamente enlaçados. Depois, como se se apercebesse da sua fraqueza, Farley afrouxou a pressão dos seus braços e Margarida deixou resvalar a cabeça até apoiá-la no peito do americano.
Farley passou a mão por aquele cabelo brilhante e sedoso, acariciando a cabeça de Margarida com um sentimento de profunda veneração e carinho.
— Amo-te — murmurou ela, baixinho. — Nunca pude imaginar que o amor proporcionasse uma felicidade tão grande...
Farley continuava calado. O seu espírito sentia-se igualmente perturbado, mas à doce sensação que o amor de Margarida lhe causava unia-se um sentimento de vergonha e confusão.
De repente, de um ponto situado um pouco acima do rio, partiu o estampido de um tiro, e um grito penetrante rasgou o silêncio da noite.
Farley endireitou-se, sobressaltado. Apurou o ouvido, mas nenhum novo ruido voltou a ouvir-se.
— Que poderia ter sido? — inquiriu Margarida, encolhendo-se tremulamente contra o seu peito.
— Não faço ideia — respondeu o rapaz. Tal vez tenha acontecido qualquer coisa ao barqueiro. Tenho do ir averiguar.
— Não vás — balbuciou a rapariga, assustada. — Temo que te aconteça algum mal.
— Não tenhas medo — tranquilizou-a. — Voltarei em seguida. Sei como ocultar-me e, aconteça o que acontecer, não sais de aqui até que eu volte. Escondida não poderão encontrar-te.
Margarida ofereceu-lhe os lábios e Farley beijou-os de novo. Depois desprendeu-se dos seus braços e embrenhou-se nas trevas, na direção que tinha sido seguida por Manuel para ir em busca da barcaça.
 

 
Nota final: Terminam aqui as passagens associadas a «Rio Grande». O que acontecerá a Farley, a Margarida e às filhas de D. António só o saberá se ler o resto da obra. Talvez um dia a digitalizemos, mas, agora, temos de ficar por aqui…

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