PAS275. O sacrifício da formosa índia

Bob Sterling dobrou-se pela cintura, contorcendo-se com dores. E um novo golpe, agora com os punhos pela nuca, fê-lo rolar pelo chão.
Ante aquele inesperado desfecho, o renegado Stanley Campbell teve a serenidade bastante para escolher a melhor solução. Dum salto, afastou-se do seu inimigo e, correndo, dirigiu-se para onde estava o cadáver de Keighley, na intenção de apoderar-se do seu revólver.
Emily Bradfford levou as mãos à garganta para afogar um grito de horror. Mas, refazendo-se imediatamente, correu atrás da índia para o sítio onde Bob Sterling caíra.
 
Este abanava a cabeça tentando recuperar-se. Mas estava tão entontecido que nem deu pela presença das duas mulheres junto dele. Foi ao ouvir uma detonação, misturada com um grito de agonia de «A na’to ki», que o seu cérebro se esclareceu. Num segundo, apercebeu-se do que acontecera e o que seguiria se não ocorresse um milagre.
 Stanley Campbell, com o revólver de Keighley, do qual se apoderara, acabava de disparar contra ele. Mas a bala foi alojar-se no peito da índia que, para o salvar, o protegera com o seu próprio corpo.
O grito da ferida, secundado com outro de Emily Bradfford, coincidiu com uma praga do assassino.
A boa sorte, que até então o acompanhara, pareceu abandoná-lo de repente. Ao puxar de novo o gatilho, disposto a liquidar todos os que tinha na frente, o percutor feriu várias vezes o mesmo cartucho vazio.
Furioso, espumando de raiva, tentou fazer rodar o tambor com a mão. Mas foi inútil. Ao cair no chão, Keighley enterrou o revólver no chão e a terra, misturada com o óleo do mecanismo, impedia agora o tambor de girar. O único tiro que pôde fazer, foi o que estava em presença do cano.
Desesperado, abriu a arma, para conseguir o que de outra forma seria impossível. Mas essa operação levou alguns segundos preciosos e que foram a sua desgraça.
Ao ver a índia banhada pelo seu próprio sangue e caída no chão, e a expressão de horror que se via nos olhos de Emily Bradfford, o caçador recobrou de repente todas as suas faculdades.
Como uma fera, precipitou-se contra o renegado caindo dobre ele, no preciso momento em que este conseguira por fim pôr a arma a funcionar.
Stanley Campbell teve então a certeza de que chegara a sua hora. Bob Sterling não perdeu tempo a bater-lhe. Levantou-o simplesmente em peso do chão e apertou-lhe o corpo nos seus poderosos braços.
Os dois homens formavam agora um quadro horripilante. O caçador, com os olhos injetados de sangue, concentrava todas as suas forças naquele abraço mortal.
Os ossos do bandido começaram a estalar. Nos seus pulmões já não entrava o ar e, com a boca aberta numa horrorosa expressão, causava medo olhar para ele.
Mas Bob Sterling não o soltou.  Continuou a apertar, a apertar com toda a fúria da sua indignação, até verificar que apenas sustinha um cadáver nos braços.
Então, deixou cair no chão o farrapo humano em que se transformara o traidor. Depois, respirando fundo, cansado, deu meia volta e foi a correr para o local onde Emily Bradfford amparava a cabeça da índia com as suas mãos.
Ao primeiro golpe de vista, Bob Sterling compreendeu que já não havia nada a fazer. A valente rapariga já não tinha salvação. A bala atravessara-lhe o peito de lado a lado perfurando-lhe um pulmão.
- «A na’to ki»! – exclamou ele ajoelhando-se ao seu lado. – Porque fizeste isto? Era a mim que ele queria matar!
O lindo rosto da jovem índia esboçou uma careta que pretendia ser um sorriso. Com os olhos brilhantes fitou o caçador. Lentamente, com voz doce e cheia de resignação, articulou:
- «A na’to ki»… já morrera sabendo que… «Na’tokina»(1)… queria a outra mulher… Grande caçador… «Na’to kina» é o dono… do coração «A na’to ki»… «A na’to ki»… não poderia viver… sem ele…
Voltou a cabeça para Emily e prosseguiu falando cada vez com mais dificuldade:
- Mulher… branca… amar… muito… «Na’tokina»… Ele também… a ama… «A na’to ki»… morre por ambos…
O corpo da linda índia estremeceu e depois fechou os olhos…
(Coleção Bisonte, nº 60)
 
 
(1) – nome que os índios atribuía a Bob Sterling
 

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